🌺 A brincadeira sagrada: do medo à maturidade do ser
O sexo, na essência, é a brincadeira do homem e da mulher — não no sentido banal da palavra, mas como um jogo divino entre forças complementares. Assim como a criança inocente brinca com bonecas ou carrinhos, o adulto desperto brinca com a energia da vida: o eros. A diferença é que essa nova brincadeira exige coragem. Se a infância é o campo da inocência, a sexualidade é o campo da maturidade — o ponto em que a inocência encontra a consciência.
Nesse jogo, não é apenas o homem que toca a mulher, ou a mulher que toca o homem — é a própria existência que toca a si mesma. O eros é o sopro da criação circulando entre dois pólos, o ritmo primordial da vida pulsando no encontro de opostos. Quando consciente, esse toque se torna oração; quando inconsciente, torna-se repetição.
Assim, a sexualidade não é apenas uma função do corpo, mas um rito cósmico — a lembrança de que a vida deseja perpetuar-se, celebrar-se e reconhecer-se através do prazer.
🧱 A muralha invisível da repressão
A sociedade, ao perceber o poder transformador contido no desejo, cria muros de contenção. O medo é o tijolo principal dessa construção invisível. “Não pode”, “é feio”, “é pecado” — são vozes que moldam o ego, essa casca protetora que aprisiona o impulso vital. No entanto, essa repressão não é apenas opressão: é também um rito de passagem. Tal como o leão expulso do bando que precisa conquistar seu próprio território, o ser humano precisa ultrapassar as muralhas internas para tornar-se senhor de si mesmo.
Com o tempo, as vozes externas tornam-se internas. Já não é o outro que proíbe, mas o próprio eu que vigia, punindo o corpo por desejar. O medo, que antes servia para proteger, passa a dividir — criando uma distância entre o que sentimos e o que acreditamos poder sentir. Assim nasce o conflito interior: o ser dividido entre a natureza e a moral, entre o impulso e a ideia, entre o corpo e o espírito.
É nesse abismo que florescem a culpa e a neurose — sintomas de uma alma que perdeu o caminho do próprio prazer.
🌿 Retornar à criança interior
Vencer o medo é reatar com a própria natureza. É despir-se das roupas simbólicas da vergonha e voltar ao estado de liberdade original. A criança brinca porque não conhece o medo; o adulto maduro brinca porque o transcendeu. Entre um e outro há o aprendizado da vida. Quando Jesus diz que o Reino dos Céus pertence às crianças, fala dessa pureza reconquistada — a inocência consciente, e não a ignorância.
O retorno à inocência começa no corpo. Respirar sem culpa, mover-se sem rigidez, permitir que o toque volte a ser linguagem — esses são os gestos simples que religam o ser ao seu templo. O corpo deixa de ser uma prisão e volta a ser caminho.
O prazer, antes culpado, torna-se bússola; o toque, antes censurado, torna-se oração silenciosa. É o corpo recordando-se de que ele próprio é uma ponte entre a terra e o céu.
Os povos que ainda vivem na nudez, em harmonia com a natureza, são testemunhos vivos dessa sabedoria ancestral. Neles, o corpo não é objeto, mas templo. O toque não é pecado, é linguagem. Em cada gesto há reverência, e em cada olhar há presença. Eles não buscam o sagrado — vivem nele.
🔥 O ciclo da superação
A repressão, portanto, é a etapa necessária da evolução. Ela força o ser humano a sair da inércia instintiva e a buscar a transcendência. O que nos diferencia dos animais não é o desejo — é a capacidade de elevá-lo, de transformar o impulso em consciência, o sexo em meditação, o prazer em comunhão.
Quando a energia do desejo deixa de buscar descarga e passa a buscar união, algo novo nasce: o prazer se torna silêncio, e o toque se transforma em contemplação. O mesmo fogo que consome também ilumina — basta mudar a direção da chama.
O sexo deixa de ser biologia e torna-se mística; o corpo deixa de ser matéria e torna-se altar. O desejo não é mais uma força cega, mas um rio que corre em direção à consciência. Nesse ponto, o ser humano começa a entrever o divino dentro de si.
A vida, como a sociedade, nos desafia a superar os próprios limites. Cada medo vencido é um portal aberto. E ao atravessá-los, reencontramos o que fomos na origem: crianças divinas, brincando com a energia da criação, agora conscientes do poder que carregamos.
No princípio, brincávamos sem saber; agora brincamos sabendo. A vida não mudou — apenas os olhos que a contemplam. E é nesse olhar desperto que o amor deixa de ser necessidade e se torna presença.
🌕 Síntese da jornada
A brincadeira sagrada começa no corpo e termina na alma.
Entre ambos, há o aprendizado do medo, a travessia da culpa e a descoberta da inocência consciente.
Freud via no sexo o início da psique; Osho viu nele o portal do espírito.
E o ser humano, ao integrar ambos, reencontra o sentido maior: transformar o prazer em consciência, e a consciência em comunhão.